INFORMAÇÃO - Os 5 inimigos das PMEs no e-commerce — e como combatê-los

20 de setembro de 2021
Exame

A internet tornou-se um espaço de oportunidades comerciais ao reduzir distâncias e facilitar interações entre diversos stakeholders, como consumidores, fornecedores, intermediadores, prestadores de serviço, entre outros. Chamamos esse fenômeno de e-commerce (ou, em português, comércio eletrônico), que consiste basicamente em transações comerciais pela internet mediante uso de equipamentos eletrônicos e acesso a plataformas digitais.

Dois tipos de atividades são recorrentes no e-commerce. A primeira é o comércio varejista ou atacadista de produtos próprios e prestadores de serviço; e a outra é a prestação de serviços em marketplace, que disponibiliza a potenciais consumidores produtos e serviços de terceiros, mediante percentual na venda pela intermediação.

As pequenas e médias empresas precisam avaliar seriamente seu ingresso nesse espaço virtual de negócios, visto ser uma plataforma essencial para interações comerciais no século XXI. Seu uso cresceu consideravelmente nos últimos anos, e é preciso ressaltar sua presença marcante durante a pandemia por Covid-19, inclusive socialmente, ao preservar a continuidade das relações econômicas em meio ao distanciamento social recomendado pelos órgãos de saúde.

A expansão dos negócios da empresa para o comércio eletrônico deve também levar em consideração os reflexos jurídicos dessa decisão. Neste artigo, vamos debater alguns desses reflexos.

Principais desafios para PMEs no comércio eletrônico

 

1. Propriedade Intelectual

O direito de propriedade intelectual é estratégico para consolidação de vantagens à empresa no mercado em que opera, agregando-lhe valor ao proteger ativos e evitar a violação de direito alheio.

Ideias, símbolos, logos, produtos, embalagens, técnicas de serviço, desenhos e inovações que a empresa desenvolver serão protegidos contra usos indevidos e ilegais, bem como poderão ser explorados economicamente de forma exclusiva, podendo a empresa, quando conveniente, conceder autorizações e licenças temporárias de uso para terceiros mediante remuneração. Importante, portanto, o registro desses ativos junto ao Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI).

Além disso, atentar-se à propriedade intelectual alheia é também fundamental, visto que a utilização indevida caracteriza ilícito cível e criminal. A mera suspeita de uso ilegal pela empresa de ativos pertencentes a terceiro pode acarretar processos judiciais, além de desgastes reputacionais desnecessários.

A título de exemplo, a prática de marketing digital conhecida por Ferramenta de Otimização de Busca (do inglês “SEO”, Search Engine Optimization), apesar de frequente em e-commerce, deve ser implementada com devida precaução.

Essa ferramenta, que consiste em ascender determinados sites a posições de destaque dentro de páginas de resultados de buscadores digitais (como Google e Yahoo), por mais que seja um meio viável de se alavancar a empresa, pode levar à caracterização de crime de concorrência desleal, com repercussão inclusive indenizatória, caso não observe boas práticas e empregue elementos de marca alheia, especialmente de concorrentes.

2. Tributação

A empresa de e-commerce precisa estar atenta a aspectos tributários que podem impactar seu plano de negócio, como a possível tributação de marketplace em ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).

A bem da verdade, a operadora de marketplace deve ser enquadrada como prestadora de serviço, enquanto facilitadora de interações entre comerciantes e consumidores. Nesse sentido, deveria ser submetida tão somente a tributo municipal, qual seja, o ISS (Imposto Sobre Serviço), enquanto vendedores, por circularem produtos próprios, inclusive na plataforma de marketplace, recolheriam o ICMS.

Todavia, alguns Estados, como Paraíba, Ceará, Mato Grosso, e São Paulo, estabeleceram, em lei, hipóteses de responsabilidade tributária para operadoras de marketplace em face do ICMS, imputando-lhes um ônus solidário junto aos demais contribuintes do imposto. Essas hipóteses, ainda passíveis de discussão no Poder Judiciário, geram insegurança jurídica e custos desnecessários ao setor de marketplace, visto que cada Estado pode ter posição e hipótese diferentes a respeito de eventual cobrança tributária dessa natureza.

3. Consumidor

Entre empresas e consumidores, estes são a parte mais frágil da relação. Isso impacta a empresa juridicamente, desde sujeição a responsabilidade solidária com demais empresas por defeito de produto, ainda que não o tenha causado, a atribuição de ônus mais rigoroso para provar que determinada alegação do consumidor é inconsistente.

Essa relação, logo, prescinde de algumas precauções por parte da empresa. Primeiramente, a divulgação de Termos de Uso da plataforma, com direitos e deveres dos usuários bem estabelecidos, pode colaborar na redução de riscos indenizatórios, na medida em que a empresa demonstra com isso sua boa-fé e enfraquece alegações contra eventuais abusos de conduta.

Em segundo lugar, o Decreto n° 7.962/2013, principal regulamento de e-commerce, traça parâmetros de atuação, que, se não observados, podem implicar em sanções administrativas, civis ou até mesmo penais.

Conforme o decreto, no site deve constar informações claras e precisas sobre a empresa que o opera, fornecedores, além de características essenciais do produto ou serviço, preço e discriminação no preço de despesas adicionais ou acessórias, modalidade de pagamento, contrato, disponibilidade, forma e prazo de execução de serviço ou entrega do produto.

Da mesma forma, a empresa deve fornecer ferramentas e serviço de atendimento para correção de problemas relacionados à contratação e para encaminhamento de demandas, reclamações e, inclusive, solicitação de cancelamento do contrato.

Com essas medidas, evitam-se ambiguidades, lacunas, pontos obscuros, ou omissão de informações que prejudiquem o consumidor e possam recair posteriormente na empresa, em forma de indenização.

Configura-se elemento também relevante nas interações consumerísticas em e-commerce o respeito pela empresa ao direito de arrependimento do consumidor. Para tanto, os consumidores deverão ser providos de meios claros e ostensivos no próprio site para cancelarem suas compras.

Válido mencionar que o cancelamento fruto de arrependimento tem prazo de até 7 dias, contado da entrega do produto ao consumidor, sendo que o custo com seu recolhimento será absorvido exclusivamente pela empresa.

Ainda, a instituição financeira ou a administradora de cartão de crédito integrante da operação de compra deve ser imediatamente comunicada do arrependimento, a fim de, ou não lançar o valor da compra na fatura do consumidor, ou realizar seu estorno.

4. Regulação

A atividade empresarial suscita adequação de empresas a marcos regulatórios e órgãos fiscalizadores específicos, como Agência Nacional de Saúde Complementar (ANS), Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), Banco Central (BACEN), ou Superintendência de Seguros Privados. É preciso, então, analisar a peculiaridade de cada caso.

Por outro lado, o produto também influencia a regulação a ser observada. Por exemplo, quando o produto ofertado estiver sujeito à regulamentação técnica do Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial (Inmetro), qualquer empresa de comércio eletrônico deverá divulgar, na oferta do produto e de forma visível ao consumidor, o selo de identificação de conformidade Inmetro, assim como as informações nele contidas, sob pena de sanções administrativas, desde multa a apreensão de mercadorias.

Além disso, o registro e a abertura de empresa submetem-se a regras tanto municipais quanto estaduais, diversas entre si, necessitando um exame minucioso de cada Município e Estado.

5. Compliance Digital

O Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) influenciam o compliance digital de empresas de e-commerce, pois priorizam transparência, proteção de dados pessoais e privacidade.

Isso implica, por exemplo, em informar claramente o titular sobre seus direitos, tratamento de seus dados e registros de acesso (data e hora) de aplicações de internet, bem como em fornecer um encarregado pelo tratamento de dados para manter comunicação com o titular de dados.

É possível, também, desenhar, no site de e-commerce, ferramentas que demonstrem consentimento livre, expresso e informado por parte do titular, seja em cadastro prévio, seja mediante aviso de cookies.

Por fim, outro desafio é estruturar a publicidade direcionada a público-alvo, prática recorrente de marketing digital utilizada em e-commerce, que envolveria o encaminhamento por e-mail de anúncios de produtos semelhantes ao histórico de compra do usuário da plataforma.

Para tanto, a empresa pode valer-se de consentimento do titular, ou da base legal da LGPD denominada “legítimo interesse” da empresa, a qual pode ser uma alternativa competitiva para pequenas e médias empresas, quando a obtenção de consentimento se mostrar complicada.

Para o uso de legítimo interesse, é importante uma reflexão cuidadosa sobre os interesses empresariais que considere as legítimas expectativas, direitos e liberdades fundamentais do titular de dados. Por exemplo, geralmente é mais fácil justificar a iniciativa de publicidade direcionada, a partir dessa base legal, quando já existe um relacionamento prévio com o titular (marketing direto).

Em contrapartida, a empresa precisa contar com mecanismos de transparência e com soluções mitigatórias de riscos a direitos e liberdades, como, possivelmente, conceder ao cliente que recebeu anúncios, a oportunidade de bloquear futuros encaminhamentos, se assim preferir.

 

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